domingo, 10 de junho de 2012
Textos: O lado zen da mata de São João
Quando nada mais importa, descobrimos o valor que damos a cada coisa, o sentido exato daquela caixa de musica ou da lembrança mais remota da infância, que teima em voltar cada vez mais nítida. Foi por isso que voltei à Mata de São João, município da Bahia em que eu passei uma boa parte da minha infância. Não que esse fosse o meu desejo mais incontrolável, mas simplesmente achei que seria uma boa idéia voltar lá quando vi a oportunidade. E estava no meu e-mail. Uma viagem de uma semana para Mata de São João com tudo incluso por um preço muito bom. Muitos desconfiariam de uma oferta assim. Mas eu já tinha viajado assim. Fui pra Chapada Diamantina, acampei lá, e tudo ocorreu perfeitamente bem.
Eu fui. Aquela seria uma ótima oportunidade de esquecer um pouco o caos meu redor. Fugir de toda a agitação das cidades.
Quando cheguei lá, continuei sem entender o porque de um preço tão baixo. O hotel no qual eu ficaria hospedada, ficava em um bairro mal localizado, mas estava, diga-se de passagem, em ótimas condições. E parecia, de qualquer modo, aconchegante.
- Eu fiz uma reserva... Comprei um pacote promocional pelo site... Meu nome é Clarisse...
O senhor que me atendeu gentilmente, me mostrou também o meu quarto.
Ele era casado, e tinha 2 filhas. Toda a família ajudava no hotel. Era uma família humilde, que tinha como maior laço, maior união, o amor uns pelos outros e por cada pessoa que passava no hotel.
Eu não sabia explicar o que estava acontecendo dentro da minha cabeça. Eu fui pra tão longe pra me divertir, ficar mais perto da natureza e atingir meu estado zen. Fui pra lembrar da minha infância e adolescência e de tudo o que eu tinha vivido ali. Lembrar das bonecas e das piculas. Dos amores e das aventuras. De todos os bons ares, e de todas as inocências. Mas aquela família me fez lembrar do ponto mais duro da minha vida.
Em resumo, eu ia mal no colégio, meus pais não me davam muita atenção, meus amigos viravam-se para as próprias vidas, e meu namorado tinha me traído com minha amiga. Foi aí que parei pra pensar e tirei a conclusão que nesse mundo, nós somos todos concorrentes. Como em um jogo, podemos nos unir a propósito de um bem comum, mas não muito mais que isso. Não é como se eu não acreditasse na bondade do homem, mas sim na honestidade. Provavelmente por isso decidi estudar pscicologia. Para entender como as pessoas jogavam. Para entender e aprender suas estratégias e ajudar a elas e a mim mesma à usar a própria razão. A única pessoa que de forma alguma poderia ser oponente um dia era eu mesma. E por isso eu cuidava de mim e dos que estavam ao meu redor e eram queridos por mim: porque me fazia bem. E a partir do momento que começa a me fazer mal, é só acabar com tudo e nunca mais repetir. É prático, simples e lógico.
Mas diante daquela família, todos os meus conceitos se desmoronaram aos poucos. A maneira que eles tratavam os seus hóspedes, era mais gentil do que o necessário. Eles realmente se preocupavam com cada um. Todos os dias de manhã, perguntavam se tinha dormido bem, e quando me viam voltar de um passeio qualquer na praia, queriam saber detalhes, se tinha me divertido. A essa altura, amigos não eram minha prioridade, é claro. Mas porque essa parecia ser a prioridade deles, nossos laços se estreitaram. E em uma semana – um tempo extremamente curto – eu sabia não só o que tinha acontecido naquele lugar nos anos em que estive fora, mas também de suas vidas, seus conflitos. Não faço idéia do porque que eles confiavam tanto em mim. Perguntei à mulher, se ela nunca tinha se decepcionado por esse motivo.
“- Muitas vezes minha filha, mais do que eu possa contar.” Quando ela começou a contar, vi que era verdade. E nada era fácil
Aquilo tudo me intrigou. Não tinha nenhuma razão lógica para tudo aquilo. Pelas condições do hotel, eles não precisavam fazer todo aquele serviço. No ultimo dia perguntei ao senhor:
- Uma coisa durante todo esse tempo não saiu da minha cabeça: porque fazer tudo isso? Pra que? Com que intenção?
- Menina, não estamos aqui por dinheiro, e nem tanto por diversão. Estamos aqui mais do que tudo que nós nascemos para ajudar pessoas, e fazê-las mais felizes. Elas poodem nos decepcionar as vezes, mas temos a certeza que algo bom de nós vai ficar com elas, e um dia, quem sabe, isso faça com que essas pessoas mudem, e enxerguem o mundo como nós. O que realmente nos faz feliz, não é o nosso próprio bem, mas é ver que nós ajudamos o outro a ver o quanto precisamos uns dos outros e o quanto somos frágeis. Existirão mil que irão nos decepcionar, mas existirão dois mil que farão tudo valer a pena.
E nem a praia, nem as baleias, nem as ondas, ou o som dos pássaros. Nada me fez entender mais o que era o estado zen do que aquela família.
Alessandra Carvalho
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2 comentários:
Profundo ...
Mto bom esse texto Alê!! =D
parabéns
me fez refletir pesado agora sobre cada palavra como se realmente eu estivesse lá.
bjoss !!
Que bom! È gostoso saber que o texto fez alguém viajar. Principalmente se forem nas lembranças
Bjão
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